segunda-feira, 15 de fevereiro de 2016

Certificado de Francês da Universidade de Montreal - Parte VI

Confesso que minha primeira sessão do Certificado de Francês da Universidade de Montreal ficou aquém do que eu imaginava. As aulas de francês oral, embora boas, eram poucas demais para permitir que eu aprimorasse meu discurso em francês (e a turma não ajudava muito, como contei). As aulas de francês escrito... bom, já chorei as pitangas nesse post aqui, então não vou repetir. Fiquei com boas notas no fim do trimestre, mas comecei a me perguntar se o que viria pela frente seria no mesmo nível (e, por tabela, se valeria a pena continuar, nesse caso). Porque ninguém merece ir para um curso sentindo que está indo pra forca.



Mas vamos por partes: quando fui aceito no programa do certificado e tive que passar por uma conselheira acadêmica (isso não é mais obrigatório), ela havia falado pra eu fazer, de início, um curso oral e outro escrito (que foi exatamente o que fiz na primeira sessão) e, na sessão seguinte, fazer um de fonética e um outro de francês escrito. Na palestra de informação sobre o certificado, a diretora do programa já havia enfatizado que muitos alunos não se preocupam com a parte escrita e acabam tendo que correr atrás do prejuízo no fim do programa ou mesmo depois de terminar o curso. Minha conselheira, na época, voltou a bater na mesma tecla. Disse para eu não deixar de lado a escrita porque era uma parte importante do curso e da língua, principalmente no mercado de trabalho.

Só que, depois do meu primeiro curso de francês escrito desanimador e da minha incapacidade de falar francês tranquilamente mesmo em situações simples, eu resolvi jogar as sugestões da dona conselheira no mato. Quer dizer, pelo menos em parte. Ora, eu estou com dificuldades é pra falar, certo? O curso foca nas partes oral e escrita, mas deixa a escolha sobre o que privilegiar por minha conta, certo? Não tive nota ruim no curso de francês escrito e ainda fui elogiado, certo? Tá certo que esse último argumento deve ser aceito com ressalvas por causa da qualidade duvidosa da aula, mas, enfim, o que eu quero dizer é que, por mais que a conselheira esteja lá pra ajudar, ela não conhece tudo a meu respeito (aliás, conhece nada). E, assim, prefiro assumir a responsabilidade do que eu fizer no curso em vez de, no fim, colocar a culpa na pobre senhora.

Com esse discurso de auto-afirmação na cabeça, me inscrevi no curso de fonética e de compreensão oral. No primeiro, porque, afinal, é um curso de prática oral, e eu fiquei com a impressão de que o meu sotaque era, digamos assim, poderoso; e no segundo, porque é um dos cursos obrigatórios, mas que eu fiquei feliz de pegar porque a gente, teoricamente, vai ser exposto a diversos sotaques de francófonos mundo afora.

Ainda assim, depois do trimestre passado, não posso dizer que estava muito IPI-IPI-URRAAA em relação a voltar às aulas. Minha esperança era que os cursos não fossem ruins e que eu conseguisse treinar mais o francês, nem que fosse batendo papo no corredor.



Compreensão Oral

Essa foi a primeira aula da sessão e, rapaz, que diferença! No trimestre passado, eu saí traumatizado da sala de aula; dessa vez, saí aliviado. Não por achar que a aula vai ser fácil, mas porque a professora não só manja dos paranauê como se mostrou totalmente aberta e receptiva. Ela não faz a linha professora amiga e descontraída, mas ela se esforça. É palpável a energia que ela dispende pra tentar deixar todo mundo à vontade. 

A turma também parece um pouco mais homogênea do que a das minhas aulas anteriores. Há pessoas que falam menos que eu, mas a maioria está mais ou menos no meu nível. Os alunos-estrela da sala são dois romenos. Ambos já estão aqui em Montreal há mais de dois anos. Não que o tempo aqui seja necessariamente proporcional à qualidade da desenvoltura em fazer biquinho: uma colombiana que senta do meu lado está aqui há cinco anos, diz que fala francês há três, e ainda tem não só um sotaque bem carregado como comete erros gerais na hora de falar. Mas fala, e se expressa bem. Ah, fora eu, não há brasileiros.

Na aula, basicamente a gente assiste a vídeos ou escuta o áudio de vários tipos de mídia, desde trechos de séries de TV francesas até entrevistas com o Seu Zé da Quitanda, que mora em Rimouski. Eu consigo entender uma boa parte da maioria do que é passado, mas vou te contar que quando são dois quebecos falando descontraidamente num bar com a música rolando e o povo falando em volta, dá vontade de voltar pra casinha, viu? Já teve entrevista com senegalês, pesquisa de opinião com idosos franceses, mas põe dois quebecos adolescentes pra cantar Frère Jacques e parece que você tá ouvindo Klingon.



Tivemos a primeira prova semana passada. Assistimos um vídeo de um programa que tinha dois convidados para falar sobre os prós e contras do inverno. Em seguida, tínhamos que resumir oralmente o que tinha acontecido no vídeo, identificando quem era a favor e quem era contra, com os respectivos argumentos. Parece simples, e até que é, mas os sotaques da apresentadora, dos entrevistados e dos convidados eram totalmente diferentes. Cada um vinha de um canto do mundo. Segundo, o vídeo não tinha nada tão óbvio quanto "então, Seu Jão, me diz aí três argumentos pró-inverno". Não, um começava a falar, outro respondia, um terceiro se metia, a apresentadora cortava pra remeter a um outro assunto ligado e daí voltava todo mundo pro ponto de partida. Não quero passar a impressão de que a prova era impossível; eu não acho que tenha ido lá muito bem, mas isso, basicamente, porque não estou com os ouvidos ainda tão afinados pro francês. Fiz o mesmo tipo de exercício em inglês na McGill, por exemplo, e lá não tive problema algum, simplesmente porque estou mais acostumado com o inglês, mesmo com sotaques diferentes. Então não tem outro remédio: é aumentar a frequência do que eu escuto em francês (atualmente, uma hora de vídeo e outra de áudio por dia) e dar tempo ao tempo.

Fonética

Já digo logo: disparado, a minha aula de francês favorita de todos os tempos! Fui meio sem saber o que esperar, e ficava imaginando diagramas da boca e garganta humanas, com indicações de onde colocar a língua, como fazer as cordas vocais subirem e como torcer as amígdalas até dar cãibra. Felizmente, a aula é muito, mas muito melhor que isso!

De cara, a professora já disse que a gente teria que se divertir na aula, e isso por uma razão muito simples: não tem como você entender de fato o que está falando errado e consertar se você não exagerar os sons. Isso dá origem a todo tipo de caras e bocas que vocês possam imaginar. De início, fiquei um pouco preocupado com essa abordagem Xou da Xuxa na aula, principalmente porque os alunos se sentiram tão à vontade que começaram a conversar e rir mesmo durante as explicações. Mas isso não tardaria a mudar. Mwahahaha!

Depois da primeira aula, que teve mais apresentação que conteúdo, cada aluno teve que fazer uma gravação de áudio lendo um texto que a professora escolheu. Ela avisou que seria bem rígida nessa avaliação, porque era pra dar uma ideia bem real e próxima de como um falante nativo percebe o sotaque e a pronúncia de um não-nativo. Então, ninguém devia se assustar se tirasse C ou D. Daí, com essa pouca pressão, lá foi o Doug fazer a gravação dele. Gravar não foi ruim: o ruim mesmo foi ter que ficar escutando minha própria voz e me dar conta que Carmen Miranda cantando com banana e abacaxi na cabeça soava mais francesa que eu. Enfim, não dava pra ficar lá no laboratório de línguas da universidade a noite toda, então teve uma hora que segurei na mão de Odin e fui. Ou melhor, cliquei em "envoyer". 

A professora tinha avisado que deixaria um comentário geral na página do nosso curso no sistema da universidade, e que entregaria uma cópia do texto com anotações mais detalhadas na aula seguinte. Só fui receber o meu comentário no dia da aula, mas valeu a pena a espera:



Gente, que alívio ler isso!!! Eu juro como estava pensando que ia ter que suar a língua, mas parece que vou conseguir levar a aula um pouco mais tranquilo! :D

Pensei que a professora, na verdade, tivesse feito um terrorzinho pra obrigar todo mundo a se esforçar na leitura, mas que ela fosse distribuir As e Bs no fim das contas. Mas me enganei: não sei a média da turma, mas vi um monte de C- nas folhas das pessoas que estavam mais próximas (daí a razão de todo mundo ter passado a rir menos e conversar menos fora de hora). A professora anunciou que só tinha dado um A. Como ainda não tinha decorado os nomes, ela perguntou quem era. Fiquei quieto de início porque aoooooonde... se eu já travo quando uma pessoa está me olhando, imagina com uma turma inteira olhando pra minha cara. Mas não teve jeito. Num outro momento, a professora me chamou pelo nome e, na frente da turma, falou sorrindo: "Ah, foi você que tirou A! Parabéns! Por que você  não falou nada quando falei que tinha sido o único A da turma?". Fiquei roxo de vergonha, tentei dar uma explicação furada que unia horóscopo com a atual situação política da Turquia, tudo isso em francês desconexo, mas a professora percebeu o meu constrangimento e voltou pra aula.

A aula, em si, consiste em fazer exercícios de conscientização (ou seja, saber, de fato, onde você está colocando a língua na hora de falar e descobrir porque não está saindo esse ou aquele som), tentar corrigir e fazer exercícios de leitura. Parece banal, mas é de uma ajuda inestimável! Estamos fazendo contraste de sons a cada aula: na primeira foi entre os sons /i/ (como em finir), /u/ (como o ou em tout) e /y/ (como o u em plu). Passamos para os diferentes tipos de "o", os diferentes tipos de "e" e por aí vai. Estou adorando e, além de corrigir palavras que eu pronunciava de forma menos distinta, ainda estou aprendendo o alfabeto fonético internacional, que é uma mão na roda na hora de fazer os exercícios (e descobrir como se lê essa ou aquela palavra em dicionários que possuem transcrição fonética).

Bom, é isso. Estou curtindo muito as duas aulas, então esse trimestre tem tudo pra ser mais leve (embora não menos trabalhoso) do que o anterior. Continuo com o objetivo de melhorar o francês, mais do que obter essa ou aquela nota, e se eu chegar ao fim da sessão melhor do que comecei, já terá valido muito a pena!

À bientôt!

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