quinta-feira, 19 de março de 2015

O (Re)Início!

E aí que eu cheguei!! Já estou devidamente imigrado das Terras Brasilis para as Terras do Norte!! Fiquei um tempo sem ter acesso pra valer a um computador, mas agora acho que vai!

Bom, quem me acompanha já há algum tempo sabe que eu, às vezes (só às vezes) escrevo bastante. Então, se te interessa saber sobre o meu processo de landing, pega um café ou chá, uns biscoitos (ou pizza) e senta que lá vem história!


Pré-viagem

Acho que, sem exageros, dá pra dizer que sábado foi um dos piores dias da minha vida. Eu sei que, pra muita gente, o dia da viagem definitiva rumo ao Canadá é o dia mais feliz e aguardado da vida. Eu também estava aguardando esse dia, mas ele não veio com aquela sensação bem resolvida e determinada e, sim, com muita angústia e tristeza.

Já quando levantei e fui dar bom dia pra minha mãe, ela desabou. Chorou muito, e eu acabei acompanhando. Eu já estava nervoso desde uns dois dias antes, com a arrumação da mala (e a constatação de que deixaria mais coisas do que imaginava) e o medo de esquecer alguma coisa importante pra hora H de passar pela imigração. Ver a tristeza da minha mãe não ajudou. Mas ela me encorajou o tempo todo, e afirmava que as lágrimas eram saudade antecipada.

O dia foi passando e eu não conseguia relaxar de jeito nenhum. Tentei levar a vida normalmente, mas tudo que eu fazia parecia artificial, porque a cabeça estava no futuro próximo do dia seguinte. Um futuro pelo qual eu esperei bastante tempo, mas que, de repente, parecia não ter mais tanta importância. Meu pai, minha mãe, minha irmã, todos aqueles que são extremamente, mas extremamente importantes mesmo pra mim, iam ficar para trás. Então, no meu caso, não adiantou muito aquela história de que eu já havia mudado de Brasília pra São Paulo, então seria mais fácil. Mais fácil é a @#%@#!!!! Acho que foi pior do que quando fui pra São Paulo!

Com as horas passando, tudo foi só piorando: pensamentos cheios de medo, falta de ar (tinha asma quando moleque, e, quando tô numa situação de muito estresse, o ar começa a faltar), uma vontade de desistir de tudo querendo se infiltrar e se instalar. Um turbilhão de lembranças, imagens, pensamentos, anseios que quase deram um nó. Eu ficava pensando: "cadê aquela sensação que todo mundo descreve nos blogues de euforia, de alegria pela partida, de finalmente estar indo realizar o sonho e tudo mais? Será que só eu é que sou esquisito??"

Quando deu a hora de ir para o aeroporto, eu estava no auge da angústia. No caminho, mais de uma vez me deu uma vontade súbita de pedir para o meu pai dar meia volta e me levar pra casa. Talvez assentar melhor o turbilhão de emoções antes de ir. Mas fiquei quieto. Procurei pensar e lembrar do que várias pessoas me haviam dito: que tudo isso faz parte, que o medo é intrínseco a qualquer mudança, que a ligação com a família não se rompe com a distância, que o dia seguinte seria melhor. E fui.

Eu estava triste por abrir mão do meu porto seguro, triste por fazer minha família passar pela minha angústia (além da que eles já passavam por eu estar me mudando), triste por não ter como saber se era a escolha certa. Na hora de embarcar, minha mãe se desmanchou de novo, e minha irmã também. Me segurei muito pra não deixar a situação pior, porque elas sabiam que eu estava extremamente nervoso, e chorar só deixaria as duas mais preocupadas. Meu pai, forte e carinhoso como sempre, me desejou tudo de bom e falou que as portas de casa estão e sempre estarão abertas.

Com um nó na garganta, fui pra sala de embarque. Eu tinha planejado fazer alguns vídeos de tudo e postar aqui, mas a angústia e o peso de tudo aquilo eram tão grandes que tiraram minha energia pra tudo. Embarquei no avião e dei tchau mentalmente para a minha Brasília.


Durante a viagem

Meu voo foi para Miami, e achei que não fosse conseguir dormir. Eu durmo mal até na minha cama, imagina numa poltrona de avião. E, com 7 horas pela frente (e minha cabeça funcionando a mil por hora), achei que não ia conseguir pregar os olhos. Mas, depois do jantar, me acomodei na janela e não é que consegui dormir umas 3 horas direto? Deus sabe que isso é um feito digno de ser gravado em pedra!

Quando despertei de vez, a angústia tinha diminuído um pouco. Apesar de ainda ameaçador, o futuro parecia um pouquinho mais cheio de esperança. As saudades de casa, da família, da segurança ainda eram grandes, mas não tinha mais aquela cara de separação definitiva, de luto. E eu procurei não me aprofundar nisso pra não trazer tudo de volta.

O nervosismo, contudo, não foi embora, e já na imigração em Miami ele deu as caras de novo. Acho que já comentei por alto no blogue que tive (e ainda tenho) um tipo de distúrbio que provoca ansiedade em excesso, o que, por sua vez, pode se manifestar de forma física (como a falta de ar ou ânsia de vômito) ou psíquica (crise de pânico). De forma que interações com pessoas sempre foram um obstáculo pra mim. Falar com estranhos, pessoalmente ou por telefone, eram um parto na minha adolescência e início da minha vida adulta. Eu hesitava, adiava, pensava em como ia falar, e, quanto mais fazia isso, mais ansioso e próximo de uma crise eu ficava. No Brasil, isso já estava beeeeeem melhor. Eu podia interagir com quase todo mundo sem parecer que tinha sido deslocado no tempo. Porém, uma das coisas que me afligia (e agora posso dizer que ainda aflige) era ter de começar a falar em inglês e francês pra ter uma vida nova em outro país. E, com toda a angústia do dia anterior, claro que não ia ser fácil, né?

Na imigração em Miami, eu quase travei. O agente começou a me fazer as perguntas de praxe e eu entendia o que ele falava, mas não conseguia responder de imediato. Ou então não entendia e simplesmente não conseguia pedir pra ele repetir. Ele volta e meia me dava uma olhada suspeita e chegou ao ponto de começar a falar espanhol achando que eu não estava entendendo. Não adiantou nada. A trava continuou. Pedi um segundo a ele, respirei fundo, fechei os olhos (Deus sabe o que passou pela cabeça dele), tentei relaxar e aí as coisas começaram a sair. Meio tronchas, meio como se eu tivesse uma batata quente na boca, mas saíram. Carimbo no passaporte, "boa viagem" e segui para pegar a mala. Quando passei pela alfândega, tudo saiu um pouquinho melhor, e o oficial me chamou até de "bro".

Despachei a mala na esteira de conexão e segui para o check-in. A trava na garganta ainda estava lá, mas foi mais fácil do que no guichê da imigração. Depois disso, foi sentar e esperar: meu voo para Montreal iria demorar ainda 5 horas pra sair, e eu nem estava confirmado nele ainda. Achei uma conexão wi-fi aberta e avisei a família e outras pessoas próximas, e tentei passar o tempo como deu.

Meu portão mudou três vezes, então peregrinei bastante de um lado para o outro. Quando enfim decidiram qual ia ser, sentei e fiquei aguardando. Falei com a agente do portão duas vezes na tentativa de confirmar meu assento, mas ela disse que só poderia fazer isso no último minuto, e que, se não desse, eu teria de ser deslocado pro voo seguinte, que sairia só três horas depois. Difícil, viu? Ainda mais com a minha garganta e língua se recusando a colaborar na comunicação. Mas, realmente, no último minuto, ela aparece gritando: "SIR, SIR! YOU'VE MADE IT! BUT YOU MUST BOARD NOW, SO HURRY!!!"

Por graça divina, fiquei num assento no corredor (tudo que eu detesto é ficar espremido entre dois estranhos) e pude ficar um tanto mais tranquilo. Muito do luto do dia anterior já tinha se dissipado, mas a angústia ainda persistia, embora mais branda. Tentei relaxar porque sabia que ainda tinha mais pela frente. Mas não consegui.


Pós-viagem e landing

O voo de Miami pra Montreal durou três horas. Não consegui comer nem beber nada à bordo. Quando o avião pousou, já comecei a respirar fundo dali (se o oxigênio do mundo começar a rarear, podem saber que eu tenho parte nisso).

Preenchi o cartãozinho da alfândega que dão no país e ainda tentei ajudar uma senhora que só falava espanhol. Agora, vocês imaginam eu, com todo esse distúrbio psicológico ativado e ligado no 220, sem conseguir me comunicar em inglês e francês, e ainda tentando me fazer entender em portunhol. E olha que eu também tinha dúvidas quanto ao preenchimento do cartão: por exemplo, no campo de "endereço", eu colocaria o meu do Brasil ou o endereço no qual ia ficar no Canadá? Então não fui de grande ajuda, mas pelo menos dei minha contribuição ajudando a carregar as malas dela.

No guichê do controle de passaportes, outro parto. Garganta fechada, língua que quase não saía do lugar, lábios que mal se mexiam. Tinha que repetir as respostas mais de uma vez, e ia me sentindo pior com isso. Ela perguntou sobre o endereço que eu tinha colocado no cartão (o meu de Brasília) e eu expliquei que estava imigrando e que aquele era meu último endereço certo e conhecido. Ela perguntou se eu ia vendê-lo e eu disse que era dos meus pais. Ela disse que tudo bem, que se tinha gente morando lá ainda então tava valendo. Disse então que era pra eu mostrar esse mesmo cartão na saída da alfândega, depois de pegar a mala, e que eles me direcionariam ao lugar apropriado.

Peguei a mala, passei pela alfândega, o agente olhou o cartãozinho, perguntou "é imigração, né?" e me mostrou uma porta ali perto pra onde eu deveria ir. Peguei uma filinha com mais alguns guichês e, na minha vez, o agente pediu meu passaporte, o cartão e a confirmação de residência permanente. Me levou pra perto do guichê de câmbio, pediu pra eu deixar as malas lá, sentar numas cadeiras próximas a outros guichês e aguardar. Foi a parte que mais demorou e, ainda assim, foi coisa de 15, 20 minutos. Um agente de imigração finalmente me chamou, me cumprimentou e eu já fui dizendo que todas as línguas tinham sumido da minha boca, o que fez ele rir. Aliás, todos os agentes foram tranquilos. Se não foram extremamente sorridentes e agradáveis, foram, pelo menos, profissionais e cordiais. Ele pediu meu passaporte, meu CSQ, minha confirmação de residência permanente. Junto foi a lista dos meus bens, e ele perguntou o que era. Expliquei que eram os itens que eu estava trazendo e os que viriam depois, e ele falou então que iria anexá-las aos meus documentos para evitar que eu fosse tributado por esses bens. Fiquei feliz de ter incluído até algumas coisas de pouco valor, porque vai que, né?

Ele pediu também meu endereço, e eu passei o do amigo na casa de quem iria ficar. Preencheu uns formulários no computador, tirou cópias dos documentos, pediu pra eu assinar umas folhas e perguntou quanto dinheiro eu estava levando em espécie. Disse a quantia e falei que traria mais do Brasil depois, mas ele não quis saber. Me deu alguns livros e folhetos e me encaminhou pra salinha do Quebec, que fica mais ao fundo, para validar meu CSQ. Lá, tive um déja vu: a salinha é bem no estilo de repartição pública brasileira. Deu até saudade do trabalho (só que não). Uma senhora com sotaque obviamente estrangeiro me atendeu, me fez algumas perguntas sobre dados pessoais, pediu o passaporte, a confirmação de residência e o CSQ, e me falou sobre o NAS e a Assurance Maladie. Saí de lá com um horário agendado na Régie d'Assurance Maladie para quinta-feira, uma palestra sobre as primeiras etapas pós-landing para sexta-feira e uma semana de palestras referentes à integração. Ganhei meu bienvenu au Québec e finalmente fui liberado (não sem antes deixar o cartãozinho da alfândega com a última agente, perto da saída).

E lá estava eu, cansadaço, ainda travadaço, com uma dor de cabeça enorme por causa do estresse e da noite mal dormida, mas sem falta de ar e, enfim, livre pra recomeçar a vida. Como podem ver, foi tudo tranquilo, exceto por mim mesmo e a minha cabeça. Mas faz parte. Vamos ver o que o futuro traz!

À bientôt!

6 comentários:

  1. Rapaz sei bem o sufoco, mas q bom q ja chegou e vamos nos falar por aqui ne homem.
    Estou colocando algumas impressões nossas sobre a primeira semana e algumas dicas espero q te ajude.

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    1. Ah, vamos, sim, sem dúvida!! Só me escrever e a gente marca!!

      Valeu pelo post, muito boas as dicas!

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  2. Geralmente não comento, mas dessa vez tive que comentar. Esse foi, de longe, o relato mais sincero e detalhado de partida que eu já li! Tenho certeza de que vou passar pela mesma angústia, também sou muito ligada à minha família. Boa sorte na nova fase!

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    1. Obrigado, Ana! Sei que, geralmente, todo mundo quer ler as experiências boas e quanto tudo está sendo feliz e legal, mas, realmente, não foi assim comigo. Não consegui simplesmente curtir o momento. Mas faz parte, e quem sabe ajuda alguns a terem uma noção maior de como pode ser ir embora.

      Obrigado e boa sorte pra você também! :)

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  3. Hey Doug. So vi o seu post agora. Vida corrida aqui agora.

    Parabénssss, Que deu tudo certo, e que sufoco heim?,

    Mais ainda bem que tudo deu certo, and Welcome to Canada :D

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    1. Valeu, meu caro! O sufoco acaba fazendo parte em um momento ou outro. O negócio é respirar fundo e ir aidante :)

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