sexta-feira, 22 de junho de 2012

Esperando... Godot

Algo extremamente comum para o(a) infeliz corajoso(a) que resolve participar do processo de imigração do Canadá (vou fazer o possível para nunca usar o verbo "aplicar" nesse sentido desleixado, descaradamente roubado do inglês, não importa o quanto a língua seja uma entidade mutável), principalmente de um ou dois anos pra cá, é a famigerada espera. Ela é quem mina, dia a dia, aos pouquinhos, quase sem perceber, a energia de quem está no processo.



Espera-se por basicamente tudo: para terminar um curso (superior, de francês ou de especialização), pelo certificado do curso, pela declaração de vínculo empregatício (que seus chefes teimam em esquecer de fazer), pela reunião de toda a papelada para enviar o dossiê, pela confirmação de recebimento, pela abertura do processo, pelo débito no cartão de crédito, pela entrevista, pelos exames médicos... Enfim, como disse, por praticamente tudo. E ela, a espera, no fim das contas, acaba se tornando aquela companhia de viagem indesejável, que a gente gostaria de largar em um posto de gasolina de beira de estrada cujo banheiro tem mais baratas que azulejos.

E, o mais sofrido, é que não há nada a fazer. Desde que comecei a ler sobre a imigração, bem antes de aplicar enviar minha documentação, eu sabia que não há processo de imigração pro Canadá sem espera. Os prognósticos já não eram favoráveis naquela época, a não ser que uma série de fatores cósmicos se combinassem no seu mapa astral e fizessem brilhar a sua estrela, como, por exemplo, profissão em demanda e idiomas nível Master Plus Ultra-Perfect Gold. Se você não tivesse isso - e eu estou nesse grupo -, não havia o que fazer: era entrar na fila e esperar, esperar, e esperar mais um pouco.

De lá pra cá, pouca coisa mudou. E o que mudou, mudou pra pior: agora, a lista de exigências se tornou mais restritiva. A espera do início, por exemplo - aquela em que você precisa correr atrás da papelada para poder enviar a documentação certinha, - aumentou. Não basta mais mandar a declaração de que você fez aulas de francês com a sua prima que morou três meses na Jamaica ou no Senegal. Agora, você precisa mandar certificados de testes reconhecidos internacionalmente. Isso faz que uma outra espera, aquela do término do curso (ou de um módulo desse curso), também aumente, já que antes muita gente fazia um curso de três ou seis meses pra falar um GÊ SUÍ BRRRÊSILIAN básico, se benzia e já entrava na salinha da entrevista. Na versão recauchutada do processo de imigração, não basta saber o básico: tem que participar (e suar) pra ganhar os pontos que podem te garantir a placa dourada na qual o CSQ é gravado.

Enfim, não é minha intenção desfilar aqui tudo o que piorou no quesito espera. Como outros colegas de processo de imigração, eu também estou aguardando. A minha etapa de espera é o resultado da análise da documentação que enviei, que pode resultar em entrevista ou... deixa pra lá. Eu já estava preparado para esperar, mas, no meu caso, o problema não é exatamente a espera, mas a motivação para continuar a fazer tarefas relacionadas ao processo de imigração. Por exemplo, uma das coisas que eu preciso continuar fazendo é procurar ofertas de emprego na minha área para levar para a entrevista e dizer: "olha aí, tá vendo, eu posso ser útil no país de vocês!". Fazia isso com certa regularidade no início do ano passado. Mas agora? O pensamento que vem é: "eu não faço ideia de se ou quando vou fazer a entrevista. Será que vai me adiantar, de alguma forma, levar vagas de um ou dois anos antes da entrevista? Será que não é melhor esperar (outra espera!) até eu saber, pelo menos, se vou fazer alguma entrevista?".

E esse pensamento acaba se estendendo pra tudo, o que deixa o tudo muito perigoso. Pra que eu vou procurar saber mais sobre os bairros de Montreal se eu não faço ideia de quando vou me mudar pra lá? Por que eu deveria pensar em abrir uma conta no HSBC agora se cobram uma taxa alta e eu, novamente, não sei quando vou pro Canadá? Vai que, até lá, o banco faliu ou melhor, aboliram os bancos e você faz tudo pelo seu tablet ou celular. Pra que eu vou pesquisar cursos em universidades canadenses se eu nem sei se vou conseguir morar perto de onde eu imagino que vou morar? Em suma, por que eu deveria sequer sintonizar a Rádio Canadá todo dia ou comprar CDs da Celine Dion, se o maldito escritório de imigração não se pronuncia sobre absolutamente nada e me deixa angustiado sem saber o que vai ser do raio da minha vida até lá, eu não tô ficando mais novo não, caramba, vou imigrar lá com 34 ou 35 anos e vou ser aqueles tios que empacotam suas compras no supermercado se eu não sei no que vai dar essa história toda?



Pois bem. É aqui que eu acho - e espero (esperar de novo, mas em outro sentido) - que começam a ser separados aqueles que vão ter mais chance de sucesso daqueles que podem ver seu projeto naufragar mais facilmente. A gente pode, sim, e até deve, xingar, espernear, brigar com o vizinho, descontar no cachorro, e tudo mais. Mas a verdade, ou pelo menos uma delas, é que imigrar NÃO é e nem NUNCA foi fácil! Seja pelo tempo e dinheiro que temos que investir nisso antes, seja pela criatividade que teremos de ter e pelos problemas que teremos de enfrentar em terras canadenses depois, não há etapa fácil nessa jornada. O desgaste é grande, o investimento financeiro é alto, a espera é maior ainda, mas tudo isso é parte de um objetivo. E, para alcançá-lo, todos nós sabíamos que teríamos de enfrentar períodos difíceis. Nessas horas de aperto, temos de nos lembrar lá de trás, do início, quando conversávamos animados sobre a imigração, sobre como ríamos imaginando os tais períodos difíceis, e, principalmente, temos de trazer aquele espírito para o presente. Precisamos ter em mente, por mais difícil que seja, que mesmo que não estejamos fazendo nada de prático e realmente ativo na questão, em algum lugar nosso processo está andando. E nós, do lado de cá, privados da visão ou do conhecimento desse caminhar, que nos deixaria mais tranquilos e conformados, temos, sim, a nossa lição de casa pra fazer! Podemos tirar folga? Podemos. Podemos deixar pra amanhã ou pra semana que vem? Claro! Todo mundo merece - e, na minha opinião, precisa - se afastar um pouco de tudo isso de vez em quando pra poder olhar pra outras coisas, relembrar o mundo ao redor e descansar da pressão e da angústia. Mas não podemos deixar totalmente de lado o plano. Pois, uma hora, mais cedo ou mais tarde, você vai conseguir o resultado do teste que estava esperando; você vai conseguir reunir toda a documentação pra enviar; você vai ser chamado pra entrevista; vão te pedir exames médicos e te dar o visto; e você vai para terras canadenses, e é aí que tudo o que você tiver feito antes vai ter que valer.

Assim, aos meus colegas e companheiros de espera, eu digo que entendo, sim, toda a angústia de vocês, pois eu também tenho as minhas. Mas não quero que a espera seja algo pra enfraquecer a gente. É uma companheira de viagem indesejável, mas o importante é a viagem, e isso a gente não deve esquecer.

Logo, logo, nas livrarias, haverá uma seção "Auto-ajuda para imigrantes".

Abraço a todos e bom fim de semana!

6 comentários:

  1. Ei, Doug! Gostei muito do seu texto! :)
    É isso mesmo, você conseguiu descrever direitinho a nossa angústia da espera e a seção de "auto-ajuda" foi ótima!

    Eu tenho a impressão de que o sofrimento da espera nos deixa mais fortes. Por vezes eu chego a imaginar que um pouco de sofrimento é necessário para tudo na vida, sabe? No caso desse processo de imigração eu fico pensando que se recebêssemos o visto no período de sei lá, 3 meses, e fôssemos embora para o Canadá completamente deslumbrados, quando déssemos de cara com a realidade da vida, voltaríamos para o Brasil correndo...

    Isso tentando ver pelo lado bom, claro. Essa cosia de ficar com a vida no limbo é indescritivelmente péssimo. Não fazemos nem desfazemos nada, fica tudo estático. Confesso que gostei do período que passei longe do processo de imigração: fingi que o Canadá não existia mais e foi ótimo! Me envolvi em diversas coisinhas, me distraí, era tudo o que estava precisando. Agora, com mais de 10 meses de Federal, estou voltando à ativa, começando a re-pesquisar coisas, enfim.

    Mas sem enlouquecer.

    Força aí!

    Abraço,
    Lidia.

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    1. Oi, Lidia!
      Eu também acho que essa angústia toda deixa a gente mais preparado pra trilhar o caminho que vai vir depois. Pelo menos, torço pra que isso ajude hehehe. Mas sem dúvida não é legal ficar com a vida meio que em modo de espera.. até pra coisas pequenas a gente acaba esperando. Eu queria trocar a TV, mas toda vez que vejo uma nas lojas, eu penso: "mas se eu comprar agora, já, já, vou ter que vender..." hehehe.

      Força pra nós!
      Abraço!

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  2. Oi Doug! Eu também passei por isso, mas meu processo foi menos demorado do que é agora. Enquanto espera, faça duas coisas importantes que podem garantir seu sucesso por aqui: estude muito francês e inglês e junte muito dinheiro! Sua vida será bem menos difícil aqui se você falar bem e tiver grana!

    Boa sorte!

    Gardene

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    1. Olá, Gardene! Sim, sim, continuo firme no francês pra poder reduzir um pouco a dificuldade com a língua quando chegar por aí. Nunca se está realmente preparado pra lidar com essa barreira da comunicação...

      Abraço!

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