E eis que meu primeiro trimestre cursando o Certificado de Francês da Universidade de Montreal vai chegando ao fim... e que longo trimestre curto foi! Ao mesmo tempo que as aulas se sucederam com uma rapidez assustadora pra mim, tinha horas que parecia que não ia acabar nunca, principalmente no que diz respeito à aula de francês escrito, tudo isso patrocinado pela minha ansiedade, claro. Afff!
Mas vamos por partes: a minha aula de francês oral já acabou. Há uma semana, para ser preciso. Como ela tem uma carga horária semanal maior, começou um pouco depois e terminou um tanto antes da de francês escrito, que só acaba daqui a três semanas. Posso dizer que fiquei bem satisfeito com a aula: como a professora deixou claro lá no início, o objetivo era falar. E isso nós fizemos! Todas as segundas-feiras, tínhamos que ler um artigo tirado da imprensa e apresentá-lo para um grupinho de alunos da turma. Além disso, a professora sempre trazia pontos gramaticais que costumam criar problemas para quem está aprendendo francês (passado do subjuntivo, condicional, etc) e dava exercícios (orais e escritos) pra gente. O uso dos pronomes (le, la, y, en...) teve um lugar cativo no coração de todos (só que não), já que a maioria tenta evitar usá-los. Também tivemos a oportunidade de assistir alguns curtas e animações em francês do Quebec, com direito a lista de expressões, diferenças entre palavras do francês daqui e de la France, entre várias outras atividades.
A turma não era exatamente empolgante. Diferentemente do que aconteceu na McGill, não houve em nenhum momento uma sensação de união, por assim dizer. Por um lado, talvez essa união esteja mais em como eu percebia as pessoas e me relacionava com elas lá na McGill do que na turma em si. De qualquer forma, eu chegava na turma da McGill e me sentia em casa; na turma da UdeM, isso não acontecia. Primeiro, porque tínhamos aulas só duas vezes por semana. Ver as pessoas todos os dias ajuda a criar intimidade ou companheirismo mais rápido, na minha opinião; então, a gente já saiu perdendo nesse quesito. Segundo, a União Europeia da sala (mais especificamente, as alemãs, a finlandesa e a austríaca) formaram um núcleo um tanto antipático. Se isolaram num lado da sala e tratavam os outros alunos com uma cordialidade fria que fez com que todo o restante da turma entendesse que elas estavam muito bem sem nós, obrigado. As únicas interações delas com o resto dos mortais era quando éramos separados em grupo para as atividades. Além disso, elas tinham o hábito extremamente desagradável de rir abertamente cada vez que alguém cometia um erro. O alvo preferido delas era um iraniano que realmente tinha imensa dificuldade pra se expressar. Bullying dos grandes, mas ele só olhava pra elas com desprezo e voltava a tentar acertar a frase. Triste da parte delas, que têm um nível alto de habilidade com o idioma. Se eu fosse religioso, faria uma prece por elas; como só o sou às terças e quintas à noite, espero que um cachorro faça xixi nos pés delas.
Outro aspecto que dificultou o entrosamento da turma (e talvez tenha se originado desse primeiro ponto aí em cima) é que os outros alunos meio que se retraíram e estabeleceram uma parceria/cumplicidade com quem estava imediatamente próximo — e só. Ninguém pareceu muito à vontade para ir sentar perto de outras pessoas que não aquelas que estavam na sua vizinhança, e nem na hora do intervalo era comum ver as pessoas interagindo. Cada um ficava com seu celular e pronto. Curiosamente, fora as alemãs e a austríaca, ninguém ficou amiguinho de alunos que tinham o mesmo idioma nativo. Talvez, de forma consciente ou não, todos tenham achado melhor evitar a possibilidade de deixar de falar francês pra falar o idioma da terra natal. O outro brasileiro da turma fugiu de mim logo na terceira aula. Nem precisava, porque eu não teria problema algum em falar só francês com ele. Mas ouvi ele dizendo pra uma aluna certo dia que ele preferia não falar com outros brasileiros porque ele achava esquisito falar outra língua que não o português com um conterrâneo. Então tá. Aparentemente, ele não foi o único a pensar assim: os iranianos só se cumprimentavam, as sul-americanas nem isso.
Acabou que fiz amizade (ou "coleguismo de sala de aula") com um espanhol, que até tentou entrar no grupinho da União Europeia (geograficamente, ele teria direito), mas não conseguiu. Talvez porque seria o único homem no grupo, talvez porque o francês dele ainda não estivesse no nível exigido para se tornar membro, ou talvez ainda porque a Espanha é economicamente mais fraca que a Alemanha, a Áustria e a Finlândia. Vai saber. O fato é que não deram muita bola pra ele (mas evitavam rir abertamente dos erros dele. Solidariedade seletiva), e ele achou que talvez tivesse mais sorte comigo. Acho que foi bom para nós dois, no fim. Como tínhamos um nível semelhante, nos sentíamos perfeitamente à vontade um com o outro para conversar e fazer as atividades durante a aula. E, como fazíamos metade do trajeto de metrô juntos, tínhamos mais oportunidade para praticar. No fim, mesmo que não tenhamos forjado nenhuma amizade verdadeira pra atravessar gerações, foi bom poder contar com alguém durante as aulas e ter um parceiro para os trabalhos e provas (além de poder dar umas risadas juntos de bobagens aleatórias) foi legal.
Ah, as provas! O que faríamos sem elas? Bom, muita coisa, eu poderia fazer uma lista, mas não importa: elas existem e a gente tem que se submeter, no fim das contas. Tivemos três travaux pratiques (que eles chamam de TP), um intra (uma prova de meio do trimestre) e o examen final. Apesar da diferença nos nomes e também no peso das notas, foram todos bastante similares: tivemos que discutir o assunto de um artigo ou vídeo que tínhamos assistido (em alguns casos, de livre escolha; em outros, indicados pela professora) antes da aula ou no próprio momento da prova, às vezes gravando a conversa em gravadores digitais, às vezes na frente da professora. Minha ansiedade não ajudava em nada quando tinha que apresentar para ou conversar diretamente com a professora, basicamente porque fico sempre constrangido na hora de falar com nativos; em compensação, ficava bem mais tranquilo quando eu só tinha que conversar com o meu colega espanhol.
As notas me surpreenderam bastante! Nivelando pela fluência que a União Europeia da turma demonstrava, eu claramente estava abaixo e, por isso mesmo, não esperava muita coisa. Não estava esperando notas baixíssimas, mas achava que ficaria na média. Quando a professora entregava as notas, porém, eu sempre me assustava, porque eram notas altas. Acabou que, embora eu ainda não tenha o resultado final, é bem possível que eu fique com A ou A- (com uma possibilidade de cair pra B+, se o meu desempenho na última prova tiver sido desastroso). Agora, uma coisa é a nota, e outra é como eu me sinto em relação à minha habilidade com o idioma. Eu acho que houve progresso, sim, embora a minha ansiedade dificulte fazer uma avaliação mais precisa. Mas eu continuo não achando que sou avançado coisa nenhuma. Eu consigo me expressar em boa parte das situações, a professora falou que meu sotaque não é um problema, mas eu sinto que me falta vocabulário, eu ainda erro tempos verbais (na hora de fazer o discurso indireto então...), e quase nunca tenho certeza de qual preposição usar com esse ou aquele verbo. Então, por mais que, para fins de histórico escolar seja ótimo ficar com um A ou A-, eu com certeza me daria uma nota mais baixa. Pra mim, aluno avançado é aquele que já domina as estruturas do idioma e está polindo o discurso, ou seja, incorporando vocabulário mais específico e/ou de linguagem mais culta. Mas deve ser por isso que não tenho escola de idiomas (e por isso que tanta gente por aí tem "avançado" no currículo).
No fim, embora as aulas de francês oral tenham sido proveitosas, vou sentir mais falta da oportunidade de praticar francês duas vezes por semana do que da turma ou das atividades em si. Mas não me arrependo de forma alguma, e fiquei contente por ter tido a chance de fazê-la. Agora é esperar o trimestre de inverno e torcer para que a fluência um dia chegue!
À bentôt!
Vamos das as maos, Doug?
ResponderExcluirPutz... Que relato mais parecido com a minha vida atual...
Enquanto lia, visualizava perfeitamente tudo o que vc passou nestes três meses de curso. É exatamente assim comigo também.
Na última segunda-feira, por exemplo, apresentei um trabalho oral sobre uma análise literária de uma poesia québéca. Jesus-Maria-José! Vai falar mal assim na casa do k@$@£hO ! E a professora disse que me saí bem e que nós imigrantes temos o péssimo hábito de nos cobrar demais. Sei nao... Mesmo com o tapinha nas costas, eu tenho certeza que falei (e ainda falo) mal bagarai. E como vc disse, agora é esperar a sessao de inverno e torcer para que a bendita fluência um dia chegue.
Um abraço solidário,
Nilian
Hahahaha vamos, sim, sem dúvidas!
ExcluirEu também não engulo muito bem esse negócio de nós, imigrantes, nos cobrarmos demais. Tudo bem, eu até acredito que a gente até queira ficar bom no idioma pra ontem e isso não é nada realista, e só contribui pra aumentar a ansiedade. Mas, ainda assim, como é que a gente não vai querer falar hoje melhor do que falamos ontem? A vontade é de se integrar totalmente, de poder colaborar e contribuir, dar risada e fazer rir, e como a gente faz isso quando ainda não se sente à vontade de verdade no idioma? Complicado, frustrante, às vezes, mas não tem remédio a não ser tomar chá de camomila e ir aos poucos, né?
Abraço, e que venha a sessão de inverno!
Doug
Pois é, meu querido! Estou pensando em seguir passos semelhantes aos seus com relação ao francês e inglês. Consegui já fazer a pré-inscrição na McGill para o intensivo de inglês, e gostei bastante do seu feedback com relação ao curso lá.
ResponderExcluirCom relação a UMontreal, foi sua escolha fazer o curso 2x por semana? Pensei em, logo que saísse da McGill, já ir direto para a UMontreal e fazer o curso de francês também intensivo. Mas sinceramente não sei se estas são as maneiras mais adequadas para alcançar níveis de fato avançados em ambas as línguas. Estou bastante preocupado com isso.
Feliz ano novo, meu caro! Grande abraço!
Então, Filipe, até onde sei, o curso de francês que faço (certificado) só tem intensivo diurno, o que daria choque de horário com o curso da McGill. Mas pode ser que a escola de línguas da UdeM tenha intensivo noturno. Dá uma olhada nisso.
ExcluirEu optei por fazer só duas aulas por semana pra dividir os custos e também porque fiquei com receio de ficar com muita coisa pra fazer. Digo isso porque, primeiro, o curso intensivo de inglês da McGill tem bastante coisa pra fazer em casa, incluindo apresentações de nível pré-projeto de conclusão de curso universitário. Segundo, como meu francês é miseravelmente pior que meu inglês, achei que passaria bem mais tempo lidando com detalhes mais básicos do idioma, coisa que não acontecia no curso da McGill (e olha que, mesmo assim, ele já tomava boa parte do meu tempo). No fim das contas, pelo menos até agora e com base nas aula que tive e estou tendo, eu poderia estar fazendo mais aulas por semana sem morrer de estresse. Mas aí entram os custos, então, por enquanto, fica como está.
Não sei se fazer dois intensivos é uma boa estratégia. Eu pensei muito nisso, mas achei melhor não ir por aí. Mas, claro, depende do teu nível nos idiomas, da tua disponibilidade, motivação, etc. Eu achei por bem fazer um de cada vez, focando primeiro no inglês, que sempre foi meu segundo melhor idioma (porque daí já ganhava a segurança pra encarar qualquer situação), e depois partir pro francês, que eu sabia que ia precisar de mais tempo e dedicação. Enfim, não tem receita válida pra todo mundo, mas leve essas questões em consideração. Você também pode começar o curso de inglês e, se sentir que está tudo tranquilo demais, começar o de francês também na sessão seguinte :)
Qualquer coisa, me dá um toque!
Abraço!
Pois é, eu estava pensando em fazer um depois do outro, mas sempre em formato intensivo. Primeiro começando com o inglês e depois com o francês. Estou exatamente no mesmo barco: inglês melhorzinho, francês capenga. Estou pensando em solicitar o Prêt et Bourse para ambos os cursos, pra dar uma aliviada, pelo menos nos custos de vida iniciais.
ExcluirEntão, cara, dá uma olhada pra confirmar, porque não sei se dá pra pedir Prêt et Bourses pro curso da McGill porque ele não é universitário (não tem crédito universitário). O da UdeM eu sei que dá pra pedir porque é universitário (1º ciclo, 30 créditos).
ExcluirMeus planos atuais é chegar no inglês também pela McGill já no curso de verão, e terminando, já juntar com o curso de outono para o francês na UMontreal. Terei entorno de 6 meses para fazer a língua ficar afinada nos dois idiomas, e então cairei com força no mercado de trabalho novamente! Mas de toda forma, serão passos semelhantes aos seus. Fiquei na dúvida, pois como você pegou o curso mais tranquilo ao invés do intensivo no francês, e não alcançou grandes resultados, imaginei que este talvez pudesse não ser um bom lugar para estudar esse idioma. Você conhece alguém que tirou o certificado de francês no curso intensivo?
ResponderExcluirObrigado pela força, meu parceiro!
Cara, ainda não encontrei ninguém que tenha feito esse certificado. De todos os imigrantes que conheci aqui, 90% fizeram a francisação do governo, uns 5% fizeram cursos avulsos de idiomas e os outros 5% não fizeram curso nenhum. O certificado da UdeM na forma não-intensiva realmente não é pra resultados rápidos, a não ser que você monte seu horário de forma a encher bem a semana. A McGill também tem um curso de francês intensivo e, se for nos moldes do de inglês, pode ser bem melhor para obter resultados rápidos.
ExcluirQualquer coisa, é só falar :)
A minha preocupação é com relação ao nível da francisação. Todos que ouço falar a respeito, dizem que ela é só até o intermediário, o qual teoricamente já estudamos. Claro que dará uma boa repaginada e recapitulada, mas não será possível avançar ainda mais no idioma. Meu intuito é avançar mais e adquirir maior segurança em ambos idiomas, e por esse motivo cogitei a McGill e a UMontreal. Vou pesquisando mais opções enquanto isso!
ResponderExcluirObrigado, meu velho!